quarta-feira, 24 de março de 2010

"Tem remédio para isto?"

Pergunta feita por uma amiga, entre lágrimas e risos.

        Remédio
Para dormir
        Remédio
Ao acordar
        Remédio
Para o apetite
        Remédio
Para não dormir
        Remédio
Para digestão
        Remédio
Para trabalhar
        Remédio
Para conviver
        Remédio
Para diversão
        Remédio
Para pensar
        Remédio
Para engravidar
        Remédio
Para nascer
        Remédio
Para desinibir
        Remédio
Para crescer
        Remédio
Para controlar
        Remédio
Para curar
        Remédio
Para transar
        Remédio
Para dor
        Remédio
Para tensão
        Remédio
Para viver
       Remédio
Para sonhar
       Remédio
Para realidade
       Remédio
Para adaptar
       Remédio
Para saudade
       Remédio
Para não morrer
   De Tédio
       Remédio

Poesia escrita em 04/02/10, mas batizada ontem pela magnífica pergunta.

domingo, 14 de março de 2010

Jardim improvável

Em solo humanamente
enriquecido:
       o humus das viceras
                já apodrecidas
                é terra firme fertilizadas
       o cálcio e os benefícios
                dos ossos já triturados
                esmigalhados misturados
                a essa terra fértil
                faz vida ainda mais vida
                nessa terra rica
       não contente em riqueza
                esse solo tão humano
                recebe em devorada felicidade
                a irrigação bombeada
                em paixão inconstante
                sangue numa explosão vulcânica
                fazendo do solo
                úmido, poroso, viceral
                uma lama fervente
                avida de vida
                avida de criação
                berçario, horta, jardim
               
Um manguezal
semeado por letras
brotante em palavras
folheado em versos
floreado em estrofes
colhido ou replantado em poesias
ou perdido em garrafas-poemas-vazias
                                                ou cheias de ausências
(na subida da maré)

segunda-feira, 8 de março de 2010

4º andar

No hall
entrada
salão festivo
elevador
escada
esporádicos
bons dias
boas tardes
boas noites
ou gesto simples
de segurar portão

No primeiro andar
sede administrativa
casa da sindica

No segundo andar
nada
a não ser
que está entre o primeiro
e o terceiro

No terceiro andar
uma laje
de separação
vozes perdidas
mal escutadas
mal entendidas
não identificadas
só do 304
que sobe em reclamação
das fumaças
das cinzas
de cigarros desgaarrados
tragados no coração

No quarto andar
quatro portas
quatros vidas
separadas
divididas
desconhecidas
isoladas
em blocos vigas e cimentos
que o ponteiro
do dia-a-dia
velozes atrozes ferozes
sela em distância
vizinhos sentimentos

Nos demais andares
escadas
e lajes acima
igualmente embotados
na distância individualista
dos cimentos blocos e vigas
edificada

sexta-feira, 5 de março de 2010

Porta-retrato

Porta fachada
num retrato fechado

Porta tristeza
num retrato sorriso

Porta lágrimas
num retrato fachada

Porta vernizes
num retrato sem cor

Porta dores
num retrato colorido

Porta vida
num retrato ferido

Porta alegria
num retrato rasgado

Porta chagas
num retrato curado

Porta fechada
Porta aberta
num retrato fachada

quinta-feira, 4 de março de 2010

temos que ser estanques ou somos voláteis?

O sol que nasce
hoje
não é o mesmo
ao se por a tarde
tão pouco
ao nascer amanhã

O rio que passa
agora
já não é o rio porvir
nem o rio ali na frente
é o que passou aqui

A árvore
na sua
raiz
constante
se move
inconstante
atemporal
não é de hoje
nem de amanhã
muito menos de ontem

O ar não para
                     é aqui
                              não é ali
                                          nem vai ser aculá
nem no passado
nem do presente
nem do futuro
é só
e todo
mo
vi
men
to

Nem o ser humano
tem por tudo
uma fixação no tempo
o tempo todo:
as ideias passam
os amores chegam
os sentimentos virão
as paixões
padecem
padeceram
padecerão

O vivo morre
o morto vive
o novo é velho
o velho é novo

Como a chuva que
cai
mesmo perene
não é aquela, daqui
agora,
a mesma ali
adiante

Como a pedra
milenar
mesmo imovel
na ilusão dos sentidos
não para
nem congela
num ponto fixo do tempo

Tudo muda todo muda tempo tudo tempo todo
tempo todo tempo tudo muda todo tempo muda
tempo muda muda todo tudo tempo tudo todo
tudo todo tudo tempo todo tudo muda tudo
muda tudo todo tudo muda tempo todo tempo
todo tempo tudo todo muda tempo muda tudo
muda tempo todo tempo todo tudo muda tudo
todo tudo muda tudo tudo todo tempo muda
tudo tempo tudo todo tempo muda tempo todo
muda todo tempo muda tempo todo tudo muda
tempo tudo tempo todo tudo muda todo tempo
todo muda tudo muda todo tempo muda tudo

num lapso
flexo
reflexo retorno
nada para tempo todo